AÇÃO ANULATÓRIA. MULTA ADMINISTRATIVA. ADUANEIRO. INSERÇÃO INTEMPESTIVA DE DADOS. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. APLICABILIDADE DA LEI 9.784/1999. PROCEDIMENTO ESPECIAL. DECRETO 70.235/1972.
I – Em relação à alegada omissão, contrariedade ou contradição suscitada, verifica-se que a recorrente se limitou a afirmar, em linhas gerais, que o acórdão recorrido incorreu em nulidade ao deixar de se pronunciar adequadamente acerca das questões apresentadas nos embargos de declaração, fazendo-o de forma genérica, sem desenvolver argumentos para demonstrar especificamente a suposta mácula. Nesse panorama, a arguição genérica de nulidade pela recorrente atrai o comando do Enunciado Sumular n. 284/STF, inviabilizando o conhecimento dessa parcela recursal.
II – Em se tratando de processo administrativo fiscal referente à multa aduaneira que não possui natureza tributária, deve ser observado o § 1º do art. 1º da Lei 9.873/1999: “§ 1º Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho”, ao invés do art. 5º do mesmo diploma legal: “Art. 5º O disposto nesta Lei não se aplica às infrações de natureza funcional e aos processos e procedimentos de natureza tributária”.
III – O então revogado art. 19-E da Lei n. 10.522/2002 não possui previsão de que se trata de norma expressamente interpretativa, assim como o voto de qualidade não se revela uma penalidade imposta ao administrado, mas apenas uma técnica válida de julgamento, considerada constitucional pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Suspensão de Segurança 5282, em 30/10/2023.
Portanto, a situação ora narrada não atrai a disciplina do art. 106 do CTN.
IV – A discussão acerca do termo final do prazo decadencial não foi objeto de apreciação do Tribunal a quo, que apenas observou o prazo quinquenal previsto nos arts. 138, 139 e 140 do Decreto-lei n. 37/1996. A empresa recorrente, por sua vez, não opôs embargos de declaração cuja finalidade seria sanar omissão quanto ao termo final do prazo quinquenal. Ademais, a recorrente não indica de que forma teria ocorrido a violação do art. 2º, I, VI e VII da Lei n. 9.784/1999 e, ainda que assim tivesse feito, tal insurgência não foi debatida no âmbito do Tribunal de origem, sendo que a mera citação ou menção superficial de dispositivos de lei federal não é condição capaz de preencher o fundamental requisito de prequestionamento da matéria controvertida, deficiência recursal que atrai a aplicação das Súmulas ns. 211/STJ e 282 e 356 do STF.
V – Sobre o aspecto analisado quanto à decadência, é irrefutável que o Tribunal de origem, ao apreciar o conteúdo probatório colacionado aos autos, consignou expressamente que a insurgência defendida pelo recorrente é contrária às evidências fáticas sobre as quais fundamentou-se o julgador a quo para solucionar a controvérsia apresentada na presente demanda judicial. Dessa forma, verifica-se que a irresignação do recorrente vai de encontro às convicções do julgador a quo, que tiveram como lastro o conjunto fático e probatório constante dos autos. Nesse diapasão, para rever tal posição seria necessário o reexame desses mesmos elementos fático probatórios, o que é vedado no âmbito estreito do recurso especial.
Incide na hipótese a Súmula n. 7/STJ.
VI – No que diz respeito à alegação de inexistência de prazo para prestação de informações anteriormente ao advento da Instrução Normativa SRF n. 510/2005, igualmente entendo que a recorrente não indica de que forma teria ocorrido a violação do art. 2º, I, IV e VII e X da Lei n. 9.784/1999 e, ainda que assim tivesse feito, tal insurgência não foi devidamente prequestionada no âmbito do Tribunal de origem sob tal aspecto. Ademais, o Tribunal a quo identificou na legislação vigente à época dos fatos o momento no qual a informação deveria ser prestada (data do voo) e, com base nas informações constantes nos autos, verificou que a recorrente, por diversas vezes, registrou os dados pertinentes ao embarque da mercadoria exportada após o prazo definido. Por se tratar de matéria de natureza fático-probatória, a sua análise fica prejudicada com fundamento no Súmula 7/STJ.
VII – A empresa recorrente defende em seu recurso especial a reforma do acórdão de origem por meio do reconhecimento da divergência jurisprudencial quanto à necessária aplicação da retroatividade benigna, considerando o prazo de 7 (sete) dias para registro de informações previsto na Instrução Normativa n. 1.096/2010. O conhecimento do recurso especial, interposto com fundamento na alínea c do permissivo constitucional, exige a indicação precisa do dispositivo legal objeto de interpretação divergente, bem como a demonstração do dissídio jurisprudencial, mediante a verificação das circunstâncias que assemelhem ou identifiquem os casos confrontados por meio da realização do cotejo analítico entre elas, nos moldes exigidos pelos arts. 255, § 1º, do RISTJ e 1.029 do CPC/2015. Ocorre que, no presente caso, a recorrente não indica quais seriam os dispositivos legais violados no contexto da divergência jurisprudencial, prejudicando o conhecimento do recurso especial.
VIII – Ainda que se entenda que o dispositivo tido por violado seja o art. 106, II, do CTN, inadmissível a interpretação no sentido de a posterior alteração do prazo para registro de informações implicar retroatividade benigna, uma vez que a estipulação de prazo não se confunde com infração ou penalidade, razão pela qual é irretocável a conclusão alcançada pelo Tribunal de origem. Outrossim, conforme asseverado pelo Tribunal recorrido, no presente caso estamos diante de infração formal de natureza administrativa, o que torna inaplicável a disciplina jurídica do Código Tributário Nacional.
IX – A Segunda Turma do Tribunal Superior de Justiça possui entendimento consolidado no sentido da inaplicabilidade do instituto da denúncia espontânea às infrações previstas no art. 107 do Decreto-lei n. 37/1966, cujo fato gerador seja a própria prestação de informações a destempo ou a não prestação de informações, conforme se verifica nos seguintes julgados: REsp n. 1.860.115/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 9/5/2023, DJe de 27/6/2023; AgInt no AREsp n. 1.582.988/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 29/4/2020, DJe de 7/5/2020.
X – Recurso especial da Fazenda Nacional parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido. Recurso especial da Société Air France parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido.
(REsp n. 2.002.852/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/8/2024, DJEN de 9/9/2025.)