JUSTIÇA FEDERAL
Subseção Judiciária de Feira de Santana-BA
1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Feira de Santana-BA
SENTENÇA TIPO “A”
PROCESSO: 1015904-54.2023.4.01.3304
CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120)
POLO ATIVO: PENHA PAPEIS E EMBALAGENS LTDA e outros
REPRESENTANTES POLO ATIVO: GIOVANA ROCHA – SP179145
POLO PASSIVO:DELEGADO DA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM FEIRA DE SANTANA e outros
SENTENÇA
- Relatório
Trata-se de mandado de segurança impetrado por PENHA PAPEIS E
EMBALAGENS LTDA e outros em face de suposta conduta reputada abusiva/ilegal
atribuída ao Delegado da Receita Federal do Brasil em Feira de Santana/BA,
objetivando provimento jurisdicional de caráter mandamental para “declarar o direito de as
impetrantes apurarem o crédito do PIS e da COFINS sobre o ICMS (incluindo-se o ICMSST), afastando-se a restrição da Lei nº 14.592/2023, bem como a manutenção do IPI não
recuperável na base de cálculo dos créditos de PIS e COFINS, por constituírem custos
dos insumos”.
As impetrantes informam que se submetem à apuração e recolhimento das
contribuições ao PIS e à COFINS pela sistemática não cumulativa.
Relatam que a MP n.1.159/2023 (convertida na Lei 14.592 de 30 de maio de
2023) alterou a disciplina da não cumulatividade das contribuições referidas, vedou
o direito ao crédito do PIS/COFINS calculado sobre a parcela do ICMS incidente nas
aquisições mercadorias para revenda e insumos. Sustentam que o montante deste tributo
estadual integra o custo de aquisição e, consequentemente, o preço do bem/mercadoria,
sendo obrigatória a sua inclusão no cálculo do crédito de PIS/COFINS.
Com relação ao IPI não recuperável, as Impetrantes, no âmbito do mesmo
regime tributário, usufruíam de crédito do PIS/COFINS sobre o IPI não recuperável,
tolerado nas aquisições para revenda com respaldo no art. 3º, inc. I das Leis 10.637/2002
e 10.833/2003. Informam que a administração tributária (RFB), por meio da edição de normas regulamentares (IN nº 1.911/2019), consignava que o IPI, quando não
recuperável, integraria o custo de aquisição da mercadoria para fins de cálculo do crédito
do PIS e da COFINS.
Menciona, todavia, que foi editada a IN RFB nº 2.121/2022. a qual disporia
que a parcela do IPI incidente na operação de aquisição, mesmo quando não
recuperável, não integraria mais o custo de aquisição do bem.
Asseveram, no entanto, que o IPI quando não recuperável integra o custo de
aquisição, devendo fazer parte, pois, da base de cálculo de créditos do PIS e da COFINS
pelo sistema não cumulativo, sob pena de violação às Leis nº 10.637/2002 e 10.637/2003.
Juntaram aos autos contratos sociais, comprovantes de inscrição e de
situação cadastral, instrumentos de mandato etc.
Despacho determinando aos impetrantes a emenda à inicial para atribuir ao
valor da causa o efetivo proveito econômico pretendido com a demanda, assim como
recolher as custas iniciais (id 1729481051).
As impetrantes cumprem a determinação judicial em id 1729481051.
Indeferida a medida liminar (id 1763724095).
O MPF deixa de se manifestar acerca da pretensão mandamental deduzida
judicialmente, tendo em vista a ausência de interesse que justificasse sua sua intervenção
(1766132572).
A União (Fazenda Nacional) requereu seu ingresso no feito (id 1783086552).
A autoridade coatora presta informações em id 1793331181. Em suma,
defende que a não cumulatividade do PIS e da COFINS é dada sempre na forma da lei,
no caso, as Leis nº 10.637/2002 e nº 10.866/2003. Não haveria, assim, princípio geral,
mas sim a faculdade de o legislador estabelecer a não cumulatividade de acordo com o
que achar pertinente.
Autos conclusos. Decido.
- Fundamentação
Para uma melhor apreciação do mérito discutido na demanda, passo à
análise das pretensões formuladas pelas impetrantes em tópicos distintos:
- a) direito de apurar os créditos do PIS e da COFINS com a inclusão do
ICMS (incluindo-se o ICMS-ST).
Neste caso, a controvérsia existente nos autos refere-se à legitimidade da
proibição, imposta originalmente pela MP nº 1.159/2023, do aproveitamento de crédito de
PIS e COFINS em relação ao ICMS incidente sobre as operações de aquisições de bens
e serviços, no regime da não cumulatividade.
Nos termos das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, é assegurado ao
contribuinte o direito ao crédito das contribuições ao PIS e à COFINS em relação a
diversos custos e despesas vinculados à sua atividade econômica. A interpretação do
conceito de “insumo”, para fins de creditamento, foi sedimentada pelo Superior Tribunal
de Justiça, em sede de recurso repetitivo (REsp nº 1.221.170/PR, Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho, 1ª Seção, DJe 24/03/2018), que estabeleceu como critérios
orientadores os princípios da essencialidade e da relevância, considerando a natureza da
atividade desempenhada pelo contribuinte e a efetiva pertinência do bem ou serviço
adquirido à produção de receitas.
A Medida Provisória nº 1.159/2023, posteriormente convertida na Lei nº
14.592/2023, promoveu significativa restrição à sistemática da não cumulatividade ao
vedar o aproveitamento de créditos sobre o valor do ICMS incidente nas aquisições. Essa
alteração legislativa, ao excluir parcela representativa da composição dos custos de
aquisição de insumos, subverte a lógica do regime não cumulativo e compromete a
coerência interna do sistema.
Com efeito, além da violação à lógica material da não cumulatividade, a
referida restrição apresenta vícios formais e materiais de inconstitucionalidade. O artigo 6º
da Lei nº 14.592/2023, oriunda da conversão da Medida Provisória nº 1.147/2022,
introduziu o inciso III ao § 2º do artigo 3º da Lei nº 10.637/2002, com a seguinte redação:
“§ 2º Não dará direito a crédito o valor:
III – do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição.”
A inclusão desta vedação constitui, em verdade, uma resposta legislativa ao
julgamento do STF no RE 574.706/PR (Tema 69), que excluiu o ICMS da base de cálculo
do PIS e da COFINS sob o fundamento de que referido valor não se incorpora à receita
bruta. Entretanto, a decisão do Supremo Tribunal Federal limitou-se à definição da base
de cálculo das contribuições, não tendo versado sobre a sistemática de apuração de
créditos. O creditamento decorrente das diferenças geradas pela exclusão do ICMS das
bases de cálculo do PIS e da COFINS não foi objeto do Tema 69.
Importa frisar que a própria Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional tentou,
sem sucesso, induzir o STF a se pronunciar sobre essa questão, por meio do Parecer SEI
nº 14.483/21/ME, durante a tramitação do RE 574.706. No entanto, a Corte Suprema
corretamente rejeitou tal abordagem, pois o objeto da controvérsia não abrangia a
sistemática de apuração de créditos no regime da não cumulatividade.
Não tendo logrado êxito no Judiciário, a União passou a adotar estratégia
legislativa. Assim, editou a MP nº 1.147/2022, originalmente destinada à reoneração do
setor aéreo no âmbito do PERSE, e nela inseriu dispositivo estranho à sua finalidade —
qual seja, a vedação ao crédito de ICMS incidente nas aquisições de bens e serviços —,
por meio de emenda parlamentar, durante o processo de conversão em lei.
Tal prática caracteriza verdadeiro “contrabando legislativo”, vedado pelo
artigo 4º da Resolução nº 1/2002 do Congresso Nacional, segundo o qual não se admite a
inserção de matéria estranha ao objeto originário da medida provisória. O Supremo
Tribunal Federal já repudiou expressamente essa manobra legislativa, como se extrai da
ADI 5.127/DF (Rel. Min. Rosa Weber, DJe 15/10/2015), oportunidade em que restou
assentado que a introdução de temas desconexos em medidas provisórias ofende o
devido processo legislativo e o princípio democrático. Observe-se:
DIREITO CONSTITUCIONAL. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. EMENDA
PARLAMENTAR EM PROJETO DE CONVERSÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA EM LEI.
CONTEÚDO TEMÁTICO DISTINTO DAQUELE ORIGINÁRIO DA MEDIDA PROVISÓRIA.
PRÁTICA EM DESACORDO COM O PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E COM O DEVIDO
PROCESSO LEGAL (DEVIDO PROCESSO LEGISLATIVO). 1. Viola a Constituição da
República, notadamente o princípio democrático e o devido processo legislativo (arts.
1º, caput, parágrafo único, 2º, caput, 5º, caput, e LIV, CRFB), a prática da inserção,
mediante emenda parlamentar no processo legislativo de conversão de medida
provisória em lei, de matérias de conteúdo temático estranho ao objeto originário da
medida provisória. 2. Em atenção ao princípio da segurança jurídica (art. 1º e 5º, XXXVI,
CRFB), mantém-se hígidas todas as leis de conversão fruto dessa prática promulgadas até
a data do presente julgamento, inclusive aquela impugnada nesta ação. 3. Ação direta de
inconstitucionalidade julgada improcedente por maioria de votos (STF, ADI 5.127/DF, Rel
Min Rosa Weber DJ 15/10/2015)(grifei).
Cabe destacar que a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE
nº 574.706/PR (Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 15/03/2017, DJe
02/10/2017), com repercussão geral reconhecida (Tema 69), limitou-se a afastar o ICMS
destacado da base de cálculo do PIS e da COFINS, sob o fundamento de que tal parcela
não se incorpora à receita bruta do contribuinte. Referido precedente, portanto, não se
presta a justificar a vedação ao crédito do ICMS pago nas aquisições, pois trata de
realidades jurídicas distintas: uma diz respeito à apuração da base de cálculo das
contribuições; outra, à formação dos créditos dedutíveis.
Nesse contexto, utilizar o precedente do STF como fundamento para impedir
o creditamento do ICMS incidente sobre as aquisições configura verdadeira deturpação
da ratio decidendi da decisão, uma vez que esta não apreciou — nem poderia apreciar —
o direito ao crédito no regime da não cumulatividade.
Ademais, a natureza instrumental da não cumulatividade impõe que sua
interpretação se dê de forma sistemática e finalística, tendo por escopo evitar a incidência
em cascata e assegurar a neutralidade fiscal sobre a cadeia produtiva. A restrição
introduzida pela Lei nº 14.592/2023 não apenas contraria essa função, mas também
acarreta aumento indireto da carga tributária, o que colide com o princípio da legalidade
estrita e da capacidade contributiva.
Importante também observar que o art. 195, § 12, da Constituição Federal
autoriza o legislador ordinário a estabelecer critérios para a aplicação da não
cumulatividade, mas não lhe confere carta branca para esvaziar o conteúdo essencial
desse regime. A vedação ao crédito do ICMS, nos moldes promovidos pela Lei nº
14.592/2023, representa autêntica inconstitucionalidade material, pois elimina, na prática,
um dos principais mecanismos compensatórios que garantem a efetividade da não
cumulatividade no campo das contribuições sociais.
Nesse sentido, é possível afirmar que a não cumulatividade, como princípio
constitucionalmente assegurado às contribuições sociais, não admite restrições
infraconstitucionais que esvaziem seu conteúdo essencial. A exclusão do ICMS das
aquisições da base de cálculo dos créditos, nos termos da Lei nº 14.592/2023, representa
verdadeiro retrocesso normativo, incompatível com a sistemática conferida pelo art. 195,
- 12, da Constituição Federal.
Portanto, a exclusão do ICMS (inclusive do ICMS-ST) incidente nas
aquisições do conceito de insumo ou custo para fins de creditamento de PIS e COFINS
viola frontalmente o princípio da não cumulatividade, afronta o art. 195, § 12, da
Constituição Federal, e compromete a segurança jurídica e a coerência sistêmica da
legislação tributária.
- b) do direito ao creditamento do IPI não recuperável.
Já a questão jurídica em discussão neste tópico é definir se o IPI não
recuperável, que representa um custo para o comprador final dos bens, deve ser
considerado um componente do custo de aquisição e, portanto, sujeito a creditamento
nas contribuições ao PIS e à COFINS.
O princípio da não cumulatividade, aplicável ao PIS e à COFINS, está
previsto no art. 195, § 12, da Constituição Federal de 1988 e tem como objetivo evitar que
o contribuinte suporte uma tributação em cascata, ou seja, a incidência de tributos sobre
sobre insumos, matérias-primas e outros componentes que formam o custo da operação
final.
A não cumulatividade do PIS e da COFINS possui características distintas da
aplicada ao ICMS e ao IPI. Enquanto estes impostos possuem previsão constitucional
expressa de não cumulatividade baseada no valor agregado (arts. 153, § 3º, II, e 155, §
2º, I), o PIS e a COFINS dependem de regulamentação por meio de leis ordinárias (Leis
nº 10.637/2002 e 10.833/2003), conferindo ao legislador maior flexibilidade na definição
dos critérios para aproveitamento de créditos.
O artigo 195, § 12, da Constituição Federal delega ao legislador ordinário a
prerrogativa de instituir a não cumulatividade do PIS e da COFINS, estabelecendo que a
sistemática deve ser regulamentada por lei. Dessa forma, os critérios de creditamento e a
definição de “insumos” ou “custos de aquisição” para fins de creditamento estão
estabelecidos nos artigos 3º das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, permitindo a
dedução de créditos referentes à aquisição de bens e serviços empregados na produção,
comercialização de bens ou na prestação de serviços.
A discussão sobre a possibilidade de creditamento do IPI não recuperável
passa pela interpretação do conceito de “custo de aquisição”. As Leis nº 10.637/2002 e
10.833/2003 preveem o direito ao crédito de PIS e COFINS sobre insumos, bens e
serviços adquiridos para o processo produtivo. No entanto, a Instrução Normativa RFB nº
2.121/2022 exclui o IPI não recuperável desse cálculo, gerando controvérsia quanto
à classificação desse tributo como custo de aquisição.
Para compreender o alcance do conceito de “custo de aquisição” e sua
relação com o IPI não recuperável, é fundamental considerar o artigo 13, caput, do
Decreto-Lei nº 1.598/1977, que trata da composição do custo de aquisição para fins de
tributação do imposto de renda. Esse dispositivo estabelece que o custo de aquisição de
mercadorias inclui despesas com transporte, seguro e tributos incidentes na aquisição. Já
o Decreto nº 9.580/2018, em seu artigo 301, § 3º, esclarece que tributos recuperáveis não
integram o custo de aquisição, mas não há definição expressa quanto aos tributos não
recuperáveis, como o IPI neste caso. Vejamos os dispositivos citados:
(Decreto-Lei nº 1.598/1977).
Art 13 – O custo de aquisição de mercadorias destinadas à revenda compreenderá os de
transporte e seguro até o estabelecimento do contribuinte e os tributos devidos na aquisição
ou importação.
(Decreto nº 9.580/2018).
Art. 301. O custo das mercadorias revendidas e das matérias-primas utilizadas será
determinado com base em registro permanente de estoques ou no valor dos estoques
existentes, de acordo com o livro de inventário, no fim do período de apuração ( Decreto-Lei
nº 1.598, de 1977, art. 14 ).(…)
- 3º Os impostos recuperáveis por meio de créditos na escrita fiscal não integram o custo de
aquisição.
Tecnicamente, argumenta-se que um tributo não incorporado ao bem ou
serviço adquirido, em termos de valor agregado, não seria um “custo de aquisição” para
fins de não cumulatividade. Contudo, na prática, a carga tributária incidente, incluindo o
IPI não recuperável, é repassada ao consumidor final no preço do produto, compondo o
custo total suportado pela empresa.
Logo, os artigos 3º das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 estabelecem que
o valor das contribuições ao PIS e à COFINS permite a dedução de créditos sobre
aquisições de bens e serviços utilizados como insumo. Essa previsão engloba tanto os
custos diretamente ligados ao processo produtivo quanto os custos de aquisição de bens
e serviços que integram o produto final ou o serviço prestado.
Diante desse cenário, o IPI não recuperável, em virtude de não poder ser
compensado em operações subsequentes, caracteriza-se como um custo efetivo para
o adquirente e, portanto, deve ser passível de crédito.
Conclui-se que, ao excluir o IPI não recuperável da base de cálculo dos
créditos de PIS e COFINS, a Instrução Normativa RFB nº 2.121/2022 ultrapassa seu
papel regulamentar, comprometendo a efetividade do princípio da não cumulatividade.
Além disso, conforme o princípio da legalidade tributária, previsto no artigo 150, I, da
Constituição Federal, qualquer restrição ao direito de crédito deve ser estabelecida por lei
e não por norma infralegal.
Dessa forma, deve-se reconhecer o direito das associadas da parte
impetrante ao creditamento do IPI não recuperável na apuração dos créditos de PIS e
COFINS, conforme previsto na legislação vigente e em respeito aos princípios
constitucionais da não cumulatividade e da legalidade tributária. Presente, portanto, a
plausibilidade jurídica invocada.
Em reforço à argumentação aqui delineada, transcrevo os recentes
precedentes:
DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS. COFINS . NÃO
CUMULATIVIDADE. ART. 195, § 12, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ARTIGOS 3º DAS
LEIS Nº 10 .637/02 e Nº 10.833/03. IPI NÃO RECUPERÁVEL NA AQUISIÇÃO DE BENS
DESTINADOS À REVENDA E/OU UTILIZADOS COMO INSUMOS. CREDITAMENTO .
POSSIBILIDADE. COMPENSAÇÃO ADMINISTRATIVA. RESTITUIÇÃO PELA VIA
JUDICIAL PRÓPRIA. PARÂMETROS . RESTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA. INVIABILIDADE.
APELAÇÃO DA UNIÃO E REMESSA OFICIAL NÃO PROVIDAS E APELAÇÃO DA
IMPETRANTE PARCIALMENTE PROVIDA. I . CASO EM EXAME 1. Apelação interposta
em face de sentença que julgou improcedente pedido de aproveitamento de créditos de PIS
e COFINS sobre o valor destacado de IPI não recuperável na aquisição de bens destinados
à revenda e/ou utilizados como insumos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2 . Discute-se a
possibilidade de aproveitamento de créditos de PIS e COFINS sobre a parcela relativa ao
IPI não recuperável na aquisição de bens destinados à revenda e/ou utilizados como
insumos. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O regime da não cumulatividade da contribuição ao
PIS e da COFINS, previsto nos § 12 do artigo 195 da Constituição Federal/88, introduzido
pela Emenda Constitucional nº 42, de 19 .12.2003. 4. As regras da não cumulatividade das
contribuições sociais em comento foram afetas, então à definição infraconstitucional, por
meio das Leis nº 10 .637/02 e nº 10.833/03. Coube a estas normas especificar, em seus
artigos 1º (caput e §§ 1º e 2º), 2º, e 3º, as situações de cobrança não cumulativa do PIS e
da COFINS. 5 . Consoante estabelecem os artigos 3º, § 2º, das Leis nº 10.637/02 e nº
10.833/03, no que importa ao caso em debate, apenas é vedado o creditamento do PIS e da
COFINS em relação às aquisições de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento das
contribuições ( PIS/COFINS) e no que se refere ao ICMS que tenha incidido sobre a
operação de aquisição. Destarte, inexiste proibição ao creditamento do PIS e da COFINS
sobre o valor destacado de IPI não recuperável na aquisição de mercadorias e/ou utilizados
como insumos . 6. Registre-se, ademais, que, se de um lado, os impostos recuperáveis
não compõem o custo de aquisição de bens ou serviços e não podem ser tratados
como se insumos fossem, de outro, o IPI não recuperável integra o valor de
aquisições de bens para efeito de cálculo do crédito do PIS e da COFINS na
sistemática não cumulativa e integra o preço da mercadoria vendida pelo
contribuinte. 7. A esse respeito, estabelece o art . 3º, § 1º, I, das Leis nº 10.637/02 e nº
10.833/03 que o aproveitamento de créditos de PIS e COFINS pela pessoa jurídica
pode ocorrer em relação ao valor dos bens adquiridos para revenda. Ora, se o IPI não
recuperável compõe o valor da mercadoria destinada à revenda, é permitido ao
contribuinte se creditar do referido valor . Precedentes desta Turma. 8. Evidencia-se,
assim, que a previsão normativa contida na IN n º 2.121/2022 editada pela SRF, no
qual estipula que a parcela relativa ao IPI incidente na venda ao fornecedor não pode
ser apropriado como crédito (artigo 170, inciso II), não possui respaldo legal . 9.
Sendo a compensação forma de extinção do crédito tributário, a teor do art. 156, II, do
Código Tributário Nacional, deve ser realizada nos termos da legislação específica do ente
federativo (art. 170, caput, do CTN) . Ressalte-se, ainda, que, com o advento da Lei nº
13.670/18 e revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei nº 11.457/07, não subsiste, em
caráter geral, o óbice à possibilidade da compensação ser realizada com as contribuições
previdenciárias . Diga-se em caráter geral, pois deve ser obedecido o regramento contido no
art. 26-A do diploma referido. 10. Com base em alentada jurisprudência e, considerando a
data da impetração do mandamus em testilha, que é necessário o trânsito em julgado da
decisão para que se proceda à compensação dos valores recolhidos indevidamente, em
consonância com o artigo 170-A do Código Tributário Nacional . 11. Quanto à restituição
administrativa do indébito, ressalvado meu posicionamento sobre o tema, curvo-me ao
entendimento desta e. Turma no sentido de reconhecer a sua inviabilidade, nos termos da
Súmula 461 do Superior Tribunal de Justiça e do art. 100 da Constituição Federal . 14.
Reconhecido o direito à compensação administrativa e a restituição pela via judicial própria,
inclusive dos valores recolhidos após a vigência da IN nº 2.121/2022, considerando-se
prescritos eventuais créditos oriundos dos recolhimentos efetuados em data anterior aos 05
anos, contados retroativamente do ajuizamento da ação mandamental, conforme o disposto
no artigo 168 do CTN c/c artigo 3º da Lei Complementar nº 118/2005, tendo em vista que o
mandamus foi impetrado em 17/10/2023. IV . DISPOSITIVO E TESE 15. Apelação da União
e remessa oficial não providas e apelação da impetrante parcialmente provida para
reconhecer a possibilidade de aproveitamento dos créditos de PIS e COFINS sobre o valor
destacado de IPI não recuperável na aquisição de bens destinados à revenda e/ou
utilizados como insumos e assegurar o direito à compensação administrativa/restituição pela
via judicial própria do indébito referente ao período posterior à vigência da IN nº 2.121/2022,
bem como aquele indevidamente recolhido nos cinco anos anteriores ao ajuizamento da
presente ação mandamental, consoante acima explicitado. —————————————-
Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal/88, art . 195, § 12; Leis nº 10.637/02 e
nº 10.833/03, arts. 3º, § 1º, I, e § 2º, II e III; Constituição Federal/88, art . 100; CTN, arts.
156, II, e 170, caput; Lei nº 11.457/07, art. 26 . Jurisprudência relevante citada: TRF 3ª
Região, 3ª Turma, ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL – 5002229-50.2023.4.03 .6100, Rel.
Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em
22/09/2024, Intimação via sistema DATA: 24/09/2024; TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI –
AGRAVO DE INSTRUMENTO – 5025974-26.2023.4 .03.0000, Rel. Desembargador Federal
CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 08/04/2024, Intimação via sistema DATA:
08/04/2024; STJ, Súmula 461.(TRF-3 – ApelRemNec: 50307041620234036100, Relator.:
DESEMBARGADOR FEDERAL NERY DA COSTA JUNIOR, Data de Julgamento:
25/02/2025, 3ª Turma, Data de Publicação: 26/02/2025) (grifei).
PROCESSO Nº: 0813587-24.2023.4.05 .8100 – APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: MITO
COMERCIO DE VEICULOS LTDA ADVOGADO: José Alexandre Goiana De Andrade
APELADO: FAZENDA NACIONAL RELATOR (A): Desembargador (a) Federal Cid Marconi
Gurgel de Souza – 3ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1º GRAU): Juiz (a) Federal
Jose Vidal Silva Neto EMENTA TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS E
COFINS. SISTEMÁTICA DA NÃO CUMULATIVIDADE . IPI INCIDENTE NA VENDA, PELO
FORNECEDOR. VEDAÇÃO AO CREDITAMENTO. ILEGALIDADE. INOVAÇÃO NO
ORDENAMENTO JURÍDICO-TRIBUTÁRIO . NÃO CUMULATIVIDADE DO PIS E DA
COFINS DISPOSTA NO ART. 3º, DAS LEIS NRS. 10.637/02 e 10 .833/03. TUTELA DE
URGÊNCIA DEFERIDA. 1. Apelação interposta pela Empresa em face de sentença que
denegou a Segurança impetrada com o fito de obter Ordem que autorize o aproveitamento
de créditos de PIS/COFINS, no regime não-cumulativo, sobre o IPI não recuperável,
incidente na aquisição de mercadorias para revenda . 2. A presente questão difere do Tema
504, do STF, que tratou acerca do crédito presumido do IPI, instituído pela Lei nr. 9363/96,
para as empresas produtoras e exportadoras de mercadorias nacionais. 3 . O art. 195, da
CF, delegou à lei ordinária a definição dos setores da atividade econômica nos quais o PIS
e a COFINS deveriam ser não cumulativos. Sobre o assunto o Pretório Excelso já firmou a
seguinte tese, em sede de Repercussão Geral, no RE 981979 (Tema 756): “I. O legislador
ordinário possui autonomia para disciplinar a não cumulatividade a que se refere o art . 195,
- 12, da Constituição, respeitados os demais preceitos constitucionais, como a matriz
constitucional das contribuições ao PIS e COFINS e os princípios da razoabilidade, da
isonomia, da livre concorrência e da proteção à confiança; II. (…)”. 4. Nesse passo, as Leis
nos 10.637/02 e 10 .833/03 instituíram o PIS e a COFINS não cumulativos, nas quais foram
previstas a hipótese de incidência, a base de cálculo, as alíquotas e a sistemática de
creditamentos. 5. A Constituição Federal explanou a não cumulatividade em seu art. 153, §
3º, II e art . 155, § 2º, I, como um sistema compensatório, segundo o qual por ocasião da
saída dos produtos serão abatidos os valores pagos na etapa anterior. 6. A questão gira em
torno da legalidade da vedação ao aproveitamento de crédito de PIS e COFINS relativo ao
IPI incidente sobre o produto adquirido para revenda, atualmente disposta no art. 171,
parágrafo único, III, da Instrução Normativa RFB 2121/2022, com a redação dada pela
Instrução Normativa RFB nr . 2152, de 14 de julho de 2023 in verbis: “Art. 171. Para efeito
de cálculo dos créditos de que trata esta Seção, integram o valor de aquisição: (…)
Parágrafo único. Não geram direito a crédito: (…) III – o IPI incidente na venda pelo
fornecedor”. 7. O art. 3º, das Leis nrs 10 .637/02 e 10.833/03, que tratam sobre o
creditamento na sistemática não cumulativa do PIS e da COFINS, não vedaram
expressamente o aproveitamento dos valores relativos ao IPI incidente sobre as
mercadorias adquiridas para revenda, como fez para o ICMS. 8. Atente-se ao princípio da
estrita legalidade tributária (artigo 150, inciso I, da CF), segundo o qual é vedado aos entes
políticos instituir ou majorar tributo por ato normativo diverso da lei . 9. A vedação ou
restrição ao creditamento, em caso de exação não cumulativa, desprovida de
qualquer motivação extrafiscal, importa em aumento de base de cálculo, acarretando,
consequentemente, majoração de tributo e assim, deve obediência ao princípio da
estrita legalidade tributária. 10. Art . 171, parágrafo único, III, da Instrução Normativa
RFB 2121/2022, com a redação dada pela Instrução Normativa RFB nr. 2152, de 14 de
julho de 2023, que extrapolou os limites legais, uma vez que gerou inovação no
ordenamento jurídico-tributário, sem respaldo legal, malferindo o 150, inciso I, da CF.
Precedente deste Tribunal no mesmo sentido: Processo 08008990620234058302,
Desembargador Federal Leonardo Resende Martins, 6ª Turma, Julgamento: 12/12/2023. 11
. O STJ já decidiu que o Mandado de Segurança é instrumento hábil à declaração do direito
à compensação de tributos indevidamente pagos (Súmula 213). 12. A compensação apenas
pode ser realizada após o trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 170-A, do
CTN, dos valores que deixaram de ser aproveitados a partir da revogação do art . 167, II, da
Instrução Normativa nr. 1911/2019 (que autorizava o aproveitamento do crédito vergastado),
perpetrada pela Instrução Normativa RFB nr. 2152, de 14 de julho de 2023, que deu nova
redação ao art. 171, parágrafo único, III, da Instrução Normativa RFB nr . 2121/2022. 13.
Atualização monetária mediante a aplicação da taxa SELIC, não podendo ser cumulada
com qualquer outro índice, seja de correção monetária, seja de juros, uma vez que a
referida taxa já engloba ambos os acréscimos, com fulcro na Lei nº 9.250/95 . 14. Tutela de
urgência deferida, para autorizar a impetrante a apropriar-se de créditos de Programa de
Integracao Social ( PIS) e Contribuição da Seguridade Social (COFINS) sobre os valores
pagos a título de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) “não recuperável”, incidente
sobre a aquisição de bens para revenda. 15. Apelação provida parcialmente, para declarar a
ilegalidade do art . 171, parágrafo único, III, da Instrução Normativa RFB 2121/2022, com a
redação dada pela Instrução Normativa RFB nr. 2152, de 14 de julho de 2023, que vedou o
aproveitamento de créditos de PIS e COFINS relativo ao IPI incidente sobre o produto
adquirido para revenda, bem como autorizar a compensação dos valores que deixaram de
ser aproveitados a partir da entrada em vigor do referido ato infralegal, com valores
atualizados pela Taxa SELIC, após o trânsito em julgado. (TRF-5 – APELAÇÃO CÍVEL:
0813587-24.2023 .4.05.8100, Relator.: CID MARCONI GURGEL DE SOUZA, Data de
Julgamento: 22/02/2024, 3ª TURMA) (grifei).
- Dispositivo
Ante o exposto, resolvendo o mérito (art. 487, I, do CPC), concedo a
segurança para:
- a) reconhecer o direito das impetrantes de apurarem e recolherem o PIS e a
COFINS na forma prevista no art. 3º, §1º das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, na
redação anterior à da Lei nº 14.592/2023, com manutenção da inclusão do ICMS e do
ICMS-ST nas aquisições, como custo de insumos; e
- b) reconhecer o direito de creditamento do PIS/COFINS sobre o IPI
irrecuperável incidente nas aquisições para revenda e produção, na forma da não
cumulatividade, por integrar o custo de aquisição.
Defiro o ingresso da União (FN) no feito (art. 7º, II, da Lei nº 12.016/2009).
A parte impetrada é isenta do recolhimento das custas iniciais. Contudo, fica
condenada ao ressarcimento das custas adiantadas pela parte impetrante.
Deixo de condenar a Impetrada ao pagamento de honorários advocatícios,
pois incabíveis na espécie (art. 25 da Lei nº 12.016/2009).
Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório (art. 14, §1º, da Lei nº
12.016/2009).
Desnecessária intimação do MPF, tendo em vista sua manifestação alhures.
Intimem-se.
Feira de Santana/BA.
Juiz Federal
TRF 1ª REGIÃO