Poder Judiciário
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Rio de Janeiro
4ª Vara Federal do Rio de Janeiro
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MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL Nº 5028922-20.2025.4.02.5101/RJ
IMPETRANTES: _________
IMPETRADO: SECRETÁRIO ESPECIAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL – UNIÃO – FAZENDA NACIONAL – BRASÍLIA
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de Mandado de Segurança com pedido de liminar impetrado por _____________________,
em litisconsórcio ativo, em face do SECRETÁRIO ESPECIAL DA RECEITA FEDERAL DO
BRASIL, objetivando o reconhecimento do direito líquido e certo de continuarem usufruindo dos
benefícios fiscais do PERSE, conforme previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/2021, pelo prazo integral
de 60 meses, ou seja, até 18 de março de 2027, com fundamento no art. 178 do Código Tributário
Nacional.
As impetrantes narram que atuam no setor de restaurantes, segmento diretamente afetado pela
pandemia da COVID-19, e que passaram a usufruir regularmente dos benefícios fiscais concedidos pelo Programa
Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), o qual garantiu a alíquota zero para IRPJ, CSLL, PIS e
COFINS pelo período de 60 (sessenta) meses, a contar de março de 2022.
Argumentam que, com a edição da Lei nº 14.859/2024, foi introduzido um limite global de R$ 15
bilhões aos benefícios do PERSE, e, em 21 de março de 2025, a Receita Federal, por meio do ADE RFB nº 2/2025,
declarou que esse teto foi atingido, extinguindo os benefícios para fatos geradores a partir de abril de 2025, o que,
segundo as impetrantes, viola seu direito adquirido e os princípios da anterioridade tributária, anual e nonagesimal.
Sustentam que o benefício fiscal foi concedido por prazo certo (60 meses) e sob condições
determinadas, caracterizando direito adquirido das contribuintes, não podendo ser revogado pela lei posterior, nos
termos do art. 178 do CTN e da Súmula 544 do STF.
Subsidiariamente, pleiteiam que, mesmo na hipótese de se entender válida a revogação dos benefícios
fiscais, seja reconhecida a necessidade de observância dos princípios da anterioridade anual e nonagesimal.
Inicial acompanhada de procuração e documentos no evento 1.
Promovido o recolhimento das custas processuais (evento 35, na razão de 1% do valor da causa),
vieram os autos conclusos para apreciação da medida liminar.
É o relatório. Decido.
Para a concessão da medida liminar em mandado de segurança, devem estar presentes,
concomitantemente, os requisitos previstos no art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009: a relevância dos fundamentos
invocados (fumus boni iuris) e o perigo de ineficácia da medida caso seja concedida apenas ao final (periculum in
mora).
No caso em análise, vislumbro a presença de ambos os requisitos.
O fumus boni iuris se evidencia pela análise da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de
Justiça, que tem reconhecido que benefícios fiscais concedidos por prazo certo e mediante condições onerosas não
podem ser revogados antes do término do prazo estabelecido em lei, sob pena de violação ao art. 178 do CTN,
conforme precedentes, dentre os quais destaco o AgInt no AgInt no REsp n. 1.820.274/SP e o AgInt no AgInt no
REsp n. 1.658.638/SC:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PIS E
CONFINS. ALÍQUOTA ZERO. PROGRAMA DE INCLUSÃO DIGITAL. LEI 11.196/2005.
INSTITUIÇÃO DA ALÍQUOTA ZERO POR PRAZO CERTO E SOB CONDIÇÕES ONEROSAS.
REVOGAÇÃO ANTES DO PRAZO FINAL. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 178 DO
CTN CONFIGURADA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, PARA CONCEDER O MANDADO DE
SEGURANÇA. DECISÃO AGRAVADA EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO
STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
- A Segunda Turma do STJ, ao julgar o REsp 1.987.675/SP, sob a relatoria do Ministro
HermanBenjamin, deixou assentado que a matéria em questão possui peculiaridades: verifica-se que,
além da alíquota zero ter sido instituída por prazo certo, as condições fixadas pela lei para a fruição
da exoneração tributária possuem caráter oneroso. Isso porque a Medida Provisória 535/2011,
04/04/2025, 11:00 Evento 37 – DESPADEC1
https://eproc.jfrj.jus.br/eproc/controlador.php?acao=acessar_documento_publico&doc=511743605250195724600536761768&evento=511743605250195724600536769989&key=e39269187adf1bf5be63f505da6f5fbe… 2/3
convertida na Lei 12.507/2011, acrescentou o § 4º ao art. 28 da Lei 11.196/2005, para exigir a
inserção, nas notas fiscais emitidas pelo produtor, pelo atacadista e pelo varejista, da expressão
“Produto fabricado conforme processo produtivo básico”, com a especificação do ato que aprova o
processo produtivo básico respectivo. A exigência de que a empresa deva se submeter a um processo
específico de produção caracteriza a onerosidade para usufruir da redução da alíquota zero. Com a
revogação do art. 28 da Lei 11.196/2005, pela Medida Provisória 690/2015, antes do prazo previsto
no art. 30, II, da mesma Lei 11.196/2005, houve, assim, quebra da previsibilidade e confiança; o que
ocasiona violação à segurança jurídica em relação aos contribuintes que tiveram que se adequar às
normas do Programa de Inclusão Digital. Portanto, ficou violado o art. 178 do Código Tributário
Nacional, ainda que, na matéria em questão, trate-se de revogação de alíquota zero. Constata-se a
onerosidade, também, ao haver previsão na Lei (art. 28, §1º, da Lei 11.196/2005, regulamentado pelo
art. 2º, do Decreto 5.602/2005) de que para a fruição da alíquota zero o contribuinte se submetia a
um limite de preço para a venda de seus produtos. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça
entende que o gozo da alíquota zero pelos varejistas demandou contrapartidas, condições, e que a
redução da alíquota a zero foi onerosa, de modo que não se consideram válidas as disposições
contidas no art. 9º da MP 690/2015, convertida na Lei 13.241/2015, que revogaram a previsão de
alíquota zero da Contribuição ao PIS e da COFINS, estabelecida na Lei 11.196/2005.
Houve, portanto, violação ao art. 178 do CTN, de forma que deve ser assegurado aos contribuintes
envolvidos no Plano de Inclusão Digital a manutenção da desoneração fiscal onerosa até o prazo
previsto no diploma legal revogado (REsp 1.987.675/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022).
- No caso, – ao consignar que “a Medida Provisória 690/2015, convertida na Lei 13.241/2015, nãoestá
revogando uma isenção concedida por prazo certo e sob determinadas condições. Trata-se, ao
contrário, de aumento de alíquota que obedeceu a todos os critérios constitucionais exigidos, sendo,
pois, inaplicável o disposto no artigo 178 do Código Tributário Nacional” -, o acórdão do Tribunal
de origem acabou por contrariar o art. 178 do CTN e divergiu, ainda, da jurisprudência dominante do
STJ. Nesse contexto, impõe-se a confirmação da decisão que, ao dar provimento ao recurso especial,
reformou o acórdão recorrido, para conceder o mandado de segurança.
- Agravo interno desprovido.
(AgInt no AgInt no REsp n. 1.820.274/SP, relator Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em
22/4/2024, DJe de 25/4/2024.)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS E COFINS.
ALÍQUOTA ZERO. BASE DE CÁLCULO. VENDAS DE PRODUTOS ELETRÔNICOS. ARTS. 28
E 30, AMBOS DA LEI N. 11.195/2005. REVOGAÇÃO ANTES DO PRAZO FINAL.
IMPOSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 489 E 1.022, AMBOS DO CPC/2015.
INEXISTÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. OCORRÊNCIA.
I – Na origem, trata-se de mandado de segurança impetrado por Lojas Salfer S.A. contra Delegado
daReceita Federal do Brasil em Joinville/SC objetivando a aplicação da alíquota zero na exigência
do PIS/COFINS sobre a receita bruta decorrente da venda dos produtos eletrônicos previstos na “Lei
do Bem”, afastando-se os efeitos da Medida Provisória n. 690/2015.
II – Na sentença, denegou-se a segurança. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida. Esta Corte
deuprovimento ao recurso especial.
III – A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que não há violação dosarts.
489 e 1.022, ambos do CPC/2015, quando o Tribunal a quo se manifesta clara e fundamentadamente
acerca dos pontos indispensáveis para o desate da controvérsia, apreciando-a e apontando as razões
de seu convencimento, ainda que de forma contrária aos interesses da parte, como verificado na
hipótese.
IV – Os embargos de declaração opostos não indicaram omissão no acórdão proferido pelo Tribunalde
origem, mas apenas manifestaram discordância quanto ao entendimento firmado sem o acolhimento
da tese de direito defendida pela recorrente.
V – Conforme entendimento pacífico desta Corte, “o julgador não está obrigado a responder a todas as
questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”.
A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 confirma a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo
Superior Tribunal de Justiça, “sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar
a conclusão adotada na decisão recorrida”. [EDcl no MS 21.315/DF, relatora Ministra Diva Malerbi
(Desembargadora convocada TRF 3ª Região), Primeira Seção, julgado em 8/6/2016, DJe 15/6/2016.]
VI – Noutro giro, da análise das razões recursais do agravo interno, é mister o reconhecimento de quea
matéria trazida no recurso especial foi devidamente prequestionada na origem, de modo que deve
ser afastada a aplicação da Súmula n. 282/STF. Além disso, a matéria posta nos autos é de cunho
eminentemente infraconstitucional, cabendo ao Superior Tribunal de Justiça a sua análise. Nesse
sentido: (REsp n. 1.987.675/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em
21/6/2022, DJe de 27/6/2022.)
VII – Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça posicionou-se pela vedação da revogação do
benefício fiscal de alíquota zero de PIS e COFINS antes de seu prazo final, com fundamento no art.
178 do CTN, porquanto a exoneração foi concedida por prazo certo e de forma onerosa e
condicionada. Assegurou-se, portanto, aos contribuintes envolvidos no Plano de Inclusão Digital, a
manutenção da desoneração fiscal onerosa até o prazo previsto no diploma legal revogado. (AgInt
no REsp n. 1.731.073/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 28/3/2022,
DJe de 31/3/2022 e AgInt no AgInt no REsp n. 1.854.392/SP, relator Ministro Gurgel de Faria,
Primeira Turma, julgado em 14/9/2021, DJe de 17/9/2021.)
04/04/2025, 11:00 Evento 37 – DESPADEC1
https://eproc.jfrj.jus.br/eproc/controlador.php?acao=acessar_documento_publico&doc=511743605250195724600536761768&evento=511743605250195724600536769989&key=e39269187adf1bf5be63f505da6f5fbe… 3/3
VIII – O entendimento ora exposto foi igualmente adotado nas decisões monocráticas proferidas
noREsp 1.958.984/RN, relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 5/9/2022; REsp
1.768.384/SC, relatora Ministra Assusete Magalhães, DJe 1º/9/2022; REsp 1.987.675/SP, Ministro
relator Herman Benjamin, DJe 27/06/2022.
IX – Agravo interno improvido.
(AgInt no AgInt no REsp n. 1.658.638/SC, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado
em 8/5/2023, DJe de 10/5/2023.)
No caso em tela, o PERSE foi instituído pela Lei nº 14.148/2021, que estabeleceu em seu art. 4º a
redução a zero das alíquotas de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS pelo prazo de 60 meses, a contar de março de 2022. As
impetrantes passaram a usufruir regularmente do benefício fiscal, organizando seus negócios e realizando
investimentos com base na expectativa legítima de manutenção desse benefício pelo prazo legal.
A limitação do custo fiscal global do programa a R$ 15 bilhões, introduzida pela Lei nº 14.859/2024,
e a declaração de atingimento desse limite pelo ADE RFB nº 2/2025, com efeitos imediatos a partir de abril de 2025,
representam, na prática, uma revogação antecipada do benefício fiscal, em aparente violação ao princípio da
segurança jurídica e ao art. 178 do CTN.
O caráter oneroso do benefício fiscal do PERSE se caracteriza pelas diversas condições impostas para
sua fruição, como enquadramento em atividades econômicas específicas, regularidade cadastral e fiscal, entre outras
exigências que demandaram adequação e investimentos por parte das contribuintes.
Ademais, mesmo que se considerasse legítima a revogação dos benefícios fiscais, há plausibilidade
na alegação de inobservância dos princípios constitucionais da anterioridade anual e nonagesimal (art. 150, III, “b”
e “c” da CF), uma vez que o ADE RFB nº 2/2025 foi publicado em 24 de março de 2025 e pretende surtir efeitos já
a partir de abril de 2025, sem respeitar os prazos constitucionais para majoração tributária.
O periculum in mora, por sua vez, está demonstrado pela iminência do encerramento dos benefícios
fiscais já a partir de abril de 2025, conforme disposto no ADE RFB nº 2/2025, o que acarretará imediato aumento da
carga tributária das impetrantes, impactando significativamente seu equilíbrio financeiro e planejamento tributário.
A irreversibilidade da medida não se verifica no caso concreto, uma vez que, caso seja posteriormente
cassada ou revogada, poderá a Fazenda Pública cobrar os créditos tributários constituídos na vigência da medida
liminar, conforme art. 63 da Lei nº 9.430/1996.
Ante o exposto, DEFIRO A MEDIDA LIMINAR para determinar que a autoridade impetrada se
abstenha de cessar os benefícios fiscais do PERSE em relação às impetrantes, mantendo a alíquota zero para IRPJ,
CSLL, PIS e COFINS, nos termos do art. 4º da Lei nº 14.148/2021, pelo prazo integral de 60 meses contados a partir
de março de 2022, ou seja, até março de 2027, independentemente do limite de R$ 15 bilhões estabelecido pela Lei
nº 14.859/2024 e reconhecido pelo ADE RFB nº 02/2025.
Notifique-se a autoridade impetrada, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações
pertinentes ao caso.
Dê-se ciência do feito ao órgão de representação da pessoa jurídica interessada para, querendo,
ingressar no feito, na forma do artigo 7º, inciso II da Lei n. 12.016/09.
Sem prejuízo, remetam-se os autos ao Ministério Público Federal, para que se manifeste no prazo de
10 (dez) dias, nos termos do artigo 12 do mesmo diploma legal.
Por fim, voltem-me conclusos para sentença.
Intime-se.