PROJETO DE LEI Nº , DE 2025.
(Do Sr. VITOR LIPPI)
Dispõe sobre a responsabilidade
tributária das plataformas digitais e dá
outras providências.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Esta Lei prevê a responsabilidade tributária das plataformas digitais
referente ao crédito tributário pelos fornecedores em relação a produtos
eletroeletrônicos, inclusive aparelhos celulares, comercializados em seu próprio
ambiente virtual no mercado nacional.
- 1º Considera-se plataforma digital aquela que:
I – atua como intermediária entre fornecedores e adquirentes nas
operações, realizadas de forma não presencial ou por meio eletrônico; e
II – controla um ou mais dos seguintes elementos essenciais à operação:
- a) cobrança;
- b) pagamento;
- c) definição dos termos e condições; ou
- d) entrega.
- 2º Não é considerada plataforma digital aquela que executa somente uma
das seguintes atividades:
I – fornecimento de acesso à internet;
II – processamento de pagamentos;
III – publicidade; ou
IV – busca ou comparação de fornecedores, desde que não cobre pelo
serviço com base nas vendas realizadas.
- 3º Para fins desta Lei, considera-se fornecedor o sujeito passivo que realiza a
entrega ou disponibilização de bens materiais por intermédio de plataformas
digitais.
CAPÍTULO II
DA SUJEIÇÃO PASSIVA
Art. 2º Fica atribuída às plataformas digitais a responsabilidade solidária pelo
crédito tributário devido pelo fornecedor nas operações de que trata o Art. 1º,
realizadas em seu próprio ambiente virtual, nas hipóteses em que:
I – plataformas digitais praticarem atos e omissões que concorram para
o não cumprimento da obrigação tributária pelo fornecedor;
II – fornecedor deixar de emitir documento fiscal previsto na legislação
para essas operações; ou
III – plataformas digitais deixarem de prestar informações solicitadas
pela administração tributária relacionada às operações.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, fica também atribuída a
responsabilidade solidária à plataforma digital relativa às penalidades
aduaneiras quando comprovada a entrada irregular no território nacional de
bem transacionado pela plataforma.
CAPÍTULO III
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 3º A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil regulamentará o
dever de prestação de informações pelas plataformas digitais relativas às
transações do comércio eletrônico no interesse da administração tributária, as
quais contemplarão, no mínimo, dados cadastrais dos fornecedores, indicação
pormenorizada de cada operação praticada, abrangendo a descrição da
mercadoria e respectivos valores envolvidos.
Art. 4º A não apresentação das informações pelas plataformas digitais ou sua
apresentação fora do prazo estabelecido, ou com incorreções ou omissões,
sujeitará as mesmas às multas previstas no art. 57 da Medida Provisória nº
2.158-35, de 24 de agosto de 2001.
Art. 5º Esta Lei entre em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICATIVA
O presente Projeto de Lei tem por objetivo estabelecer a
responsabilidade solidária das plataformas de intermediação digital
(marketplaces) pela comercialização de produtos eletrônicos, como celulares e
tablets, que ingressem no mercado nacional sem nota fiscal, sem garantia, sem
certificação técnica ou provenientes de descaminho.
O crescimento do chamado “mercado cinza” de eletrônicos tem gerado
sérios prejuízos à economia nacional, à segurança dos consumidores e à
indústria formal. Dados da Receita Federal apontam que, em 2023, mais de
650 mil celulares foram apreendidos em ações de combate ao contrabando e
descaminho, com valor estimado em 550 milhões de reais. Esse número, vale
destacar, não inclui os resultados da operação Barba Negra, realizada no fim
de 2024, cujas apreensões ainda estão sendo triadas, o que indica que o
volume total pode ser ainda maior.
Estima-se, conforme levantamento da Associação Brasileira da Indústria
Elétrica e Eletrônica (Abinee), que cerca de 20% dos celulares vendidos
atualmente no país são irregulares, seja por ausência de homologação pela
Anatel, seja por ingresso ilegal no território nacional. A entrada desses
produtos ocorre por rotas terrestres, marítimas e aéreas, com destaque para as
fronteiras com o Paraguai, mas também por vias do Norte e por importações
aéreas vinculadas a e-commerces e marketplaces.
A Anatel tem buscado coibir a comercialização desses aparelhos,
especialmente por meio de parcerias com plataformas digitais. Houve,
inclusive, uma ligeira redução nas vendas irregulares em determinados
períodos após a adoção de medidas mais rígidas e da ameaça de
responsabilização de marketplaces. Entretanto, mesmo com essas ações, os
indicadores voltaram a crescer, demonstrando que as estratégias adotadas até
o momento não têm sido suficientes para conter a escalada do problema. Os
vendedores ilegais se adaptam rapidamente, mudam a forma de distribuição e
mantêm estoques descentralizados, dificultando o rastreio e as apreensões.
Essa realidade prejudica a arrecadação tributária, desestimula a
indústria nacional, elimina empregos formais e expõe o consumidor a riscos
significativos, uma vez que produtos não certificados podem apresentar falhas
de segurança, causar acidentes e não oferecem qualquer suporte técnico ou
garantia legal.
Neste cenário, torna-se indispensável responsabilizar as plataformas
digitais que intermediam e facilitam esse tipo de comercialização. Ao prever a
responsabilidade solidária dos marketplaces na venda de produtos eletrônicos
sem comprovação fiscal, técnica ou legal, esta proposta fortalece o comércio
formal, protege o consumidor e contribui para um ambiente de negócios mais
justo, ético e competitivo no Brasil.
O Brasil não dispõe de legislação específica que trate exclusivamente de
transações realizadas por meio de plataformas digitais, bem como de normas
tributárias na esfera federal que permitam a Secretaria Especial da Receita
Federal do Brasil identificar de forma mais eficiente e eficaz irregularidades
tributárias praticadas por meio do comércio eletrônico no mercado nacional.
Os valores relativos ao comércio eletrônico nacional são expressivos,
alcançando R$ 185,7 bilhões, em 2023, correspondentes a 395,1 milhões de
pedidos e a 87,8 milhões de compradores. O grande número de fornecedores
que praticam comércio por meio de plataformas digitais traz o risco de que
parte das operações comerciais realizadas em ambiente virtual possam se dar
sem aderência à legislação tributária e aduaneira.
O Marco Civil da Internet (Lei Nº 12.965, de 23 de abril de 2014)
estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no
Brasil. Dentre os princípios que regem o uso da internet incorporados nesta Lei,
é relevante para o presente Projeto de Lei o princípio disposto no inciso VI do
art. 3º da Lei nº 12.965/2014, ao prever a “responsabilização dos agentes de
acordo com suas atividades, nos termos da lei”.
As Cortes Superiores já apreciaram divergências no campo cível
relacionadas ao direito dos consumidores e responsabilização subjetiva por
culpa derivada de conduta omissiva das plataformas digitais. Algumas decisões
citam o dever da diligência média que se espera dos intermediadores no
espaço virtual em relação à individualização dos fornecedores de bens
comercializados por meio das plataformas digitais.
Na seara tributária, vislumbra-se também a necessidade de diligência
média das plataformas digitais como forma de inibir o comércio irregular de
bens que se dá pela inobservância da conformidade mínima esperada dos
fornecedores que utilizam o ambiente virtual para realizações de suas
respectivas transações comerciais.
Como forma de alinhamento, este Projeto de Lei traz a definição de
“plataformas digitais” e emprega o conceito de “fornecedores” (vendedores que
comercializam seus bens por meio de plataformas digitais), à semelhança da
Lei Complementar nº 214, de 16 de janeiro de 2025 (artigos 22 a 25), que tem
a finalidade de complementar a recente Reforma Tributária brasileira advinda
da promulgação da Emenda Constitucional Nº 132, de 20 de dezembro de
2023.
A definição aqui proposta para “plataformas digitais” também se alinha à
iniciativa apresentada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) no documento intitulado “Role of digital platforms in the
collection of VAT/GST on online sales”, ou “Papel das plataformas digitais na
cobrança do Imposto sobre Valor Agregado nas vendas online”, em tradução
livre. Este trabalho foi elaborado com a participação de países membros e não
membros da OCDE, bem como de outras organizações internacionais, num
esforço coletivo para apresentar respostas ao desafio mundial enfrentado por
todas as administrações tributárias face ao comércio eletrônico. O documento
propõe medidas para ampliar a conformidade tributária no e-commerce e
estimular a cooperação das plataformas digitais com o Estado.
Em particular, o relatório da OCDE estabelece funções mínimas
exercidas pelas plataformas digitais e que permitem caracterizá-las como tal.
Prevê, ainda, hipóteses de exclusão do conceito de plataformas digitais nos
casos de caracterização de entidades que prestam serviços ou oferecem
infraestrutura no espaço virtual, mas que exercem isoladamente somente uma
das funções ali definidas.
A hipótese de responsabilização tributária das plataformas digitais
encontra amparo na Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário
Nacional), que estabelece normas de sujeição passiva e redireciona a
responsabilidade pelo crédito tributário a terceiros, como forma de tornar mais
efetiva a atuação da administração tributária.
O art. 124 do CTN, II, trata da solidariedade tributária passiva para
pessoas expressamente designadas por lei.
Nesse sentido, o Projeto de Lei estabelece hipóteses de ocorrência de
fatos jurídicos que caracterizam a solidariedade tributária das plataformas, que
seriam:
- a) a prática de atos e omissões pelas plataformas digitais que concorram para
o não cumprimento da obrigação tributária pelo fornecedor;
- b) a comercialização de bens por meio das plataformas sem que o fornecedor
emita documento fiscal previsto em legislação para essas operações; ou
- c) o descumprimento, pelas plataformas, em prestar informações solicitadas
pela administração tributária relacionadas às operações comerciais dos
fornecedores que operam no ambiente virtual, a eles disponibilizado.
Para promover a conformidade e inibir a comercialização nas
plataformas digitais de bens cuja entrada no território nacional tenha se dado
de forma irregular, no caso das hipóteses “b” e “c” fica também atribuída a
responsabilidade solidária quanto às penalidades aduaneiras relativas à
comercialização desses bens no ambiente virtual das plataformas.
A terceira hipótese de solidariedade decorre do descumprimento de
dever instrumental, ou seja, do não cumprimento de obrigações acessórias
impostas às plataformas digitais. A situação se enquadra no art. 113, § 2º, do
Código Tributário Nacional, que prevê a possibilidade de instituir obrigações
acessórias no interesse da arrecadação ou da fiscalização tributária. Nesse
sentido, espera-se que as plataformas digitais colaborem com a administração
tributária, fornecendo informações relevantes que já estão disponíveis em seus
próprios sistemas. Essa cooperação está alinhada à busca por maior
praticidade, eficiência e confiabilidade na transferência de dados do
contribuinte para o Estado.
Observe-se que a hipótese de responsabilidade tributária proposta
apoia-se nas experiências vivenciadas por outros entes federados, a exemplo
das legislações editadas pelos Estados da Bahia, Ceará, Mato Grosso,
Paraíba, Rio de Janeiro e São Paulo, que contemplam ao menos uma das três
hipóteses de responsabilidade solidária passiva, previstas neste Projeto de Lei.
A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil fica por essa lei
autorizada a editar norma instituindo obrigação acessória a ser observada
pelas plataformas digitais, com previsão de disponibilização de informações à
administração tributária, na forma por ela instituída, relacionadas a transações
comerciais realizadas nos respectivos ambientes virtuais.
A inobservância da norma a ser instituída pela Secretaria Especial da
Receita Federal do Brasil sujeitará as plataformas digitais às multas previstas
no art. 57 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001.
Por estas razões, esperamos contar com a colaboração dos nobres
colegas parlamentares para a aprovação deste importante projeto de lei.
Sala das Sessões, em de de 2025.
Deputado VITOR LIPPI
PSDB/SP